Muitas vezes, quando pensamos em práticas de atenção plena, enfatizamos a importância da respiração. Ao prestar atenção na respiração, permanecemos presentes e nos ancoramos nela para não nos perdermos em nossos pensamentos. Você já se perguntou por que prestar atenção na respiração é tão importante?
Nos ensinamentos do Zen budismo, a meditação é praticada na posição sentada apenas com a atenção na respiração. No começo, não é necessário forçar nenhum padrão específico de respiração, só observar o seu fluxo natural. Quando o foco está na respiração, começamos a nos distanciar dos nossos pensamentos e conseguimos permanecer no presente. Esse primeiro passo — descrito como uma consciência das “ondas da mente” no livro de Shunryu Suzuki, Mente Zen, mente de principiante — nos permite pensar na respiração como ondas no oceano.
Ao fazer isso, conseguimos imaginar que, quando existe um furacão no meio do oceano das nossas mentes, podemos sentir ondas maiores quebrando mais rápido na nossa praia. Portanto, a praia reflete o que está acontecendo no oceano. As ondas do mar mudam dependendo do momento do dia ou das estações do ano. Da mesma forma, a reação da mente varia dependendo de como nos sentimos em geral, se nos acalmamos, nos alteramos, dormimos bem ou comemos alguma coisa. Então, o que você está sentindo tanto emocional quanto fisicamente afeta o seu jeito de respirar.
A experiência humana é muito complexa. Dezenas de milhares de neurônios são ativados a cada momento. Sua pele, o maior órgão do corpo, reúne informações a cada segundo por meio dos seus sentidos, e você tem emoções e pensamentos o tempo todo. Somos um ecossistema completo com propriedades como o vento, o sal e os navios que navegam pelas nossas águas. Seria impossível tentar investigar e mudar cada parte de nós, certo? Então, o que podemos fazer é sentar e observar como as ondas vêm e vão e perceber as mudanças que se desenrolam no nosso próprio mar pessoal.
Na prática, definimos a intenção de ter consciência do fluxo da nossa respiração. Ao fazer isso, nosso objetivo é silenciar nossos pensamentos ativos, criando um espaço e um momento onde podemos coexistir com eles. Criar esse espaço pode trazer benefícios, como diminuir os sintomas de ansiedade, melhorar a qualidade do sono e aliviar o estresse. Vamos analisar melhor como a anatomia da respiração se relaciona com esses benefícios.
Uma das respirações mais naturais que você pode observar é a respiração dos bebês. Por quê? Ainda no útero, estamos nos adaptando a algumas das nossas funções vitais. Respiramos o líquido amniótico como os peixes no mar. Por causa da sua fisiologia e do cérebro em desenvolvimento, o bebê é um ser muito impulsivo, que simplesmente reage às suas necessidades imediatas.
Quando o bebê está com fome, ele chora para receber alimento; quando tem sono, ele dorme. Isso parece muito com viver no momento atual e estar presente no seu corpo, não é?
O bebê também não tem experiências, traumas, pensamentos acumulados e lições aprendidas. Isso é óbvio, já que esse serzinho ainda não desenvolveu nenhuma habilidade linguística ou neurológica. Então, ele não consegue processar pensamentos nem positivos, nem negativos e não guarda memórias como nós fazemos. A mente dos bebês está limpa. Vamos mergulhar mais fundo na relação entre a respiração e uma mente limpa e renovada.
Muitas vezes, se você observar um ser humano que acabou de nascer, vai perceber o movimento da sua barriga. Quando o bebê respira, a barriga dele sobe e desce suavemente com a respiração. Esse padrão de respiração não acontece só com bebês, é claro, porque nós também podemos respirar assim quando estamos deitados ou relaxados. Talvez você tenha ouvido alguém explicar o termo “respiração diafragmática” como respirar com a barriga. Parte disso é verdade, mas para explicar totalmente, precisamos falar sobre a física por trás da respiração primeiro.
No tórax, os pulmões e o coração estão localizados na parte superior, atrás das costelas, separados dos outros órgãos internos da parte inferior por um músculo conhecido como diafragma. Você pode pensar nesse músculo como uma cortina que divide uma sala em dois ambientes.
Quando inspiramos, os pulmões se enchem de ar e expandem como uma bexiga, criando espaço para as costelas se expandirem também. Quando os pulmões e as costelas se expandem, o diafragma é empurrado para baixo.
Esse empurrão para baixo faz a barriga se expandir para os lados, assim como acontece quando nos sentamos em uma bola de ginástica. Quando respiramos mais fundo, usamos de forma mais eficaz a capacidade dos nossos pulmões. Se a respiração é rasa, essa expansão é insignificante. Então, quando as pessoas pensam em “respiração diafragmática”, geralmente elas a confundem com puxar o ar para dentro da barriga. Já que é fisicamente impossível encher a barriga de ar, sabemos que essa parte não é verdade. Mas o diafragma sempre faz parte do processo de respiração! Podemos simplesmente aprofundar a respiração, usando toda a capacidade dos pulmões quando focamos nossa atenção no movimento do diafragma.
A melhor forma de aplicar essa técnica é deitar-se de barriga para cima, relaxar os ombros, deixando os braços abertos e os pés separados em uma posição confortável. Procure relaxar o pescoço, as costas e o quadril o máximo possível.
Agora, comece a concentrar a atenção na sua respiração. Durante um minuto, procure observar como o movimento da barriga muda cada vez que você inspira e expira. Depois, contraia de propósito os músculos da barriga, como se alguém estivesse prestes a dar um soco nela, depois relaxe esses músculos. Faça isso mais algumas vezes. Depois, tente imitar o movimento de soltura dos músculos abdominais quando eles já estiverem relaxados. Para fazer isso, você pode tentar apertar a barriga com os seus dedos e ver se os músculos ainda estão rígidos ou se eles estão moles e relaxados.
Depois de ver que sua barriga está soltinha, comece a inspirar bem devagar e profundamente. Você pode até colocar a palma da sua mão na barriga para ver se ela sobe. Ao continuar respirando, procure inspirar e expirar de forma cada vez mais prolongada e profunda. Depois de se acostumar a respirar fundo, você pode tentar respirar como se estivesse inflando a barriga, mas a chave é fazer isso sem endurecer os seus músculos.
A resposta curta é que o estresse pode causar tensão no seu abdômen. Muitas vezes, quando estamos estressados, contraímos os músculos da barriga por instinto.
Pela forma como os seres humanos evoluíram, temos a tendência de encurtar e fortalecer os músculos do abdômen, já que eles abrigam alguns dos órgãos vitais mais vulneráveis do nosso corpo. Então, quando estamos com medo, sob ameaçados ou intimidação, o sistema nervoso interpreta a situação como uma questão de sobrevivência e aí contraímos o abdômen. Em muitos casos, o “estresse” que sentimos no dia a dia é decorrente de emoções ou pensamentos.
O estresse é uma reação do organismo às coisas que acontecem ao nosso redor e muitas vezes acaba nos levando a procurar abrigo ou encontrar comida. Um exemplo da vida moderna: é necessário ter um certo nível de estresse para completar as tarefas do seu trabalho, no entanto, quando o nível ideal de estresse é ultrapassado e acontecem outras reações fisiológicas ou você continua liberando hormônios relacionados a ele, esse estado começa a se tornar prejudicial. O resultado é um “esgotamento por estresse”. Se esse estado persistir, isso pode levar ao que chamamos de “síndrome de esgotamento”, o que alguns chamam de burnout, e outras doenças relacionadas ao estresse. Geralmente, o estresse prolongado causa desconforto físico, como dores pelo corpo, no peito, nas costas, no pescoço, na cabeça, azia e outros.
Felizmente, podemos usar a respiração para aliviar uma parte desses sintomas. O corpo trabalha com a mente em um ciclo de comunicação e resposta. Então, a sua forma de pensar e reagir ao estresse pode afetar como o seu corpo o processa. Por exemplo: se você se deitar imóvel por alguns minutos sem estar com sono, seu corpo entende que você está com sono e começa a criar as condições necessárias para dormir. Então, você entra em um estado de sonolência e acaba adormecendo.
Ao manter o relaxamento nos seus músculos, na postura e na respiração, a mensagem de que você está relaxando acaba chegando ao seu sistema nervoso. Um sistema nervoso relaxado pode afetar o seu humor e o seu estado mental. A reação de “lutar ou fugir” está relacionada com o sistema nervoso simpático e muitas vezes é ativada em momentos de estresse. Além disso, quando essa reação de lutar ou fugir do sistema nervoso está ativa, temos a tendência a respirar de forma rasa e rápida. Quando a barriga fica relaxada, a respiração fica constante e prolongada e a reação de lutar ou fugir do sistema nervoso é desligada automaticamente.
Problemas para dormir podem aparecer por diversos motivos e muitas vezes são causados por um aumento na atividade cerebral. No dia a dia, geralmente estamos em estado de alerta constante por causa do tempo que passamos em frente às telas. Ficar muito tempo exposto à luz artificial, especialmente quando não mexemos o corpo de vez em quando, pode atrapalhar a forma como o nosso corpo processa os hormônios do sono.
Outra coisa que causa a hiperatividade do cérebro são os nossos pensamentos. Talvez você esteja pensando muito rápido em várias coisas e não consegue adormecer. Esses pensamentos podem estar relacionados a algo que aconteceu no passado ou em situações hipotéticas que podem acontecer no futuro. Isso parece familiar?
Esse estado do cérebro está relacionado aos hormônios do estresse e ao sistema nervoso simpático. Se você tiver dificuldade para dormir por causa de pensamentos, talvez ache que é praticamente impossível parar de pensar ou encontrar respostas satisfatórias para as suas perguntas e suposições às três da manhã.
O que você pode fazer é usar a técnica de respiração diafragmática por alguns minutos. A chave aqui é não perder o foco no seu corpo e na sua respiração. Talvez não funcione como mágica, mas se usar essa técnica regularmente, você pode começar a desenvolver um senso mais profundo de autoconsciência. Quanto mais você praticar esse exercício, mais fácil vai ser para relaxar o corpo e a mente.
Talvez você não tenha esse problema de pensar demais, mas ainda tenha dificuldades para dormir. Essa técnica de respiração profunda também pode ajudar a relaxar o seu corpo aos poucos.
Cada vez mais ouvimos a palavra “ansiedade” usada na linguagem do dia a dia. A ansiedade pode surgir em resposta a vários estímulos e cada pessoa tem uma experiência diferente. Algumas se sentem ansiosas na cidade porque estão desconectadas da natureza, outras sentem uma ansiedade social com a aglomeração de pessoas. Muitas ainda ficam ansiosas por causa do isolamento causado pela pandemia ou pelo tempo que passam em frente às telas. Quando nos referimos à ansiedade, falamos de uma variedade de experiências que cada vez mais pessoas têm vivido todos os dias.
Às vezes podemos ver essa preocupação excessiva ou ansiedade como estados temporários. No entanto, com o estresse do nosso dia a dia, talvez pareça impossível sair desse ciclo de pensamentos. Podemos nos sentir presos e começar manifestar sintomas físicos como tremor, suor, tontura, confusão mental, náusea e outros.
Muitas vezes, o que está por trás dos nossos pensamentos de ansiedade é a necessidade de segurança. Quando não nos sentimos em segurança, temos a tendência de nos prender a pensamentos e hipóteses negativas. Nós nos deixamos levar pela nossa percepção da realidade e acabamos ignorando ou nos esquecendo das nossas necessidades reais. A mente pode produzir pensamentos diversos e infinitas possibilidades. Se nos desconectarmos das nossas emoções e necessidades atuais, podemos confundir essa realidade distorcida com a realidade. Talvez pareça impossível dar um passo para trás e ver as coisas com clareza. Então, começamos a moldar o nosso mundo com base nesses pensamentos desagradáveis.
Além disso, o corpo também pode reagir e responder com base nessa realidade distorcida. Se você imaginar que teve uma discussão com alguém que você gosta na sua mente, seu corpo vai reagir como se você estivesse com raiva de verdade. O batimento cardíaco começa a acelerar, você sente um aperto no peito e o corpo libera adrenalina. Você consegue entender agora por que temos sintomas de ansiedade quando nos deixamos levar por nossos pensamentos sem perceber?
Então, a primeira coisa que devemos abordar é a nossa necessidade emocional e nos perguntar: “Do que eu preciso neste momento?” ou “Quais das minhas necessidades estou negligenciando quando sinto ansiedade?”. Para acalmar essas emoções e tranquilizar o sistema nervoso, você agora sabe o quanto a respiração é essencial. Ao sentir sintomas muito fortes, talvez não seja viável usar uma das técnicas de respiração. No entanto, você pode tentar manter a atenção na sua respiração, tentando torná-la mais profunda aos poucos. Após se sentir um pouco mais forte e estável, você pode praticar a respiração diafragmática regularmente. Com a prática, vai ser mais fácil usar essa técnica nos momentos mais difíceis. Não se esqueça, você está realmente treinando um músculo! Sim, praticar a respiração é como treinar levantando peso na academia e precisar usar o músculo trabalhado em situações de emergência no dia a dia.
Você vê a respiração diafragmática de forma diferente depois de ler este artigo? Já praticou essa técnica de respiração antes? Acha que pode se beneficiar dela? Se sim, compartilhe a sua impressão e experiência com a gente!
Tradutora: Mariana Ciocca Alves Passos